Ciber/espa/SUS – heterotopias – crônica da vida cotidiana na RHS – 16/11/2014

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ciber/espa/SUS – heterotopias – crônica da vida cotidiana na RHS – 16/11/2014

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FILE: Electronic Language International Festival

Petros Vrellis

 

Escrever é um devir. É abrir uma brecha num mar de possibilidades infinitas e caminhar por um fluxo que nos carrega alegremente. Ao contrário das frequentes lamentações que  ouvimos em torno da dificuldade da escrita, entregar-se livremente a ela como num mergulho parece ser um modo potente de comunicar, criando assim um campo comum de conversa. Uma idéia aqui, outra ali e logo somos aliciados por um plano que vai dando consistência para aquilo que queremos produzir na busca de um diálogo. Pois faz parte dessa liberdade e alegria saber que não escrevemos sozinhos. Carregamos um mundo conosco nesta autoria coletiva.

Ontem fui capturada por uma fala de Emília, editora da RHS, sobre a abertura de espaços que a RHS produz em seu desejo de conexões. Associei imediatamente com um conceito belíssimo de Foucault, a heterotopia, e, de pronto, me ocorreu o mote dessas mal traçadas linhas. Linhas de fuga, como sempre, pois tratamos aqui de dar relevo aos conteúdos que comparecem na rede como um contra-espaço e contra-tempo, uma experiência daquilo que vivemos como um espaSUS. 

Um espaço utópico na maioria das vezes, porque sem lugar ainda, mas sempre em vias de se atualizar. Nas cabeças e nos sonhos – seria esse um espaço? – daqueles que se batem por idéias de um SUS que dá certo. Algumas se tornam utopias situadas por poderem ir adquirindo a consistência necessária para constituírem uma realidade. É o caso das postagens que relatam muitas experiências concretas e reais, pautadas por outros modos de pensar as questões da saúde.

“Não se vive em um espaço neutro e branco”, diz Foucault. “Não se vive, não se morre, não se ama no retângulo de uma folha de papel. Vive-se, morre-se, ama-se em um espaço quadriculado, recortado, matizado, com zonas claras e sombras, diferenças de níveis, degraus de escada, vãos, relevos, regiões duras e outras quebradiças, penetráveis, porosas. Há regiões de passagem, ruas, trens, metrôs; há regiões abertas de parada transitória, cafés, cinemas, praias, hotéis, e há regiões fechadas do repouso e da moradia. Ora, entre todos esses lugares que se distinguem uns dos outros, há os que são absolutamente diferentes: lugares que se opõem a todos os outros, destinados, de certo modo, a apagá-los, neutralizá-los ou purificá-los. São como que contraespaços. As crianças conhecem perfeitamente esses contraespaços, essas utopias localizadas. É o fundo do jardim, com certeza, é com certeza o celeiro, ou melhor ainda, a tenda de índios montada no celeiro, ou é então – na quinta-feira à tarde – a grande cama dos pais. É nesta grande cama que se descobre o oceano, pois nela se pode nadar entre as cobertas; depois essa grande cama é também o céu, pois se pode saltar sobre as molas; é a floresta, pois pode-se nela esconder-se; é a noite, pois ali se pode virar fantasma entre os lençóis; é, enfim, o prazer, pois no retorno dos pais, se será punido.” ( … ) "A sociedade adulta organizou, e muito antes das crianças, seus próprios contraespaços, suas utopias situadas, esses lugares reais fora de todos os lugares.” ( … ) “O jardim, desde os recônditos da Antiguidade, é um lugar de utopia. Temos a impressão talvez de que os romanos se situam facilmente em jardins: é fato que os romanos nasceram, sem dúvida, da própria instituição dos jardins. A atividade romanesca é uma atividade jardineira.”

Foucault afirma, então, a possibilidade dessas utopias que têm um espaço preciso e real. Diz: "É bem provável que cada grupo humano, qualquer que seja, demarque, no espaço que ocupa, onde realmente vive, onde trabalha, lugares utópicos, e, no tempo em que se agita, momentos ucrônicos". Arrisco dizer que a vida em redes virtuais é uma dessas utopias situadas. E que na RHS emergem muitos relatos desta dimensão em ato:

https://redehumanizasus.net/87681-roda-de-conversa-discute-o-papel-do-sus-no-sistema-prisional

“Essa relação com a PNH é uma construção constante. A gente acredita que algumas discussões como que tipo de clínica vamos oferecer ao sistema prisional é importante, porque não é uma clínica só de Atenção Básica, ela tem outras interfaces que precisam ser trabalhadas como a gestão entre os trabalhadores da Saúde e da Justiça dentro dos presídios”, afirma Marden Filho Soares, coordenador da Área Técnica de Saúde no Sistema Penitenciário do DAPES.

https://redehumanizasus.net/87683-no-sus-tambem-tem-saude-indigena

https://soundcloud.com/redebrasilatual/sintonia-sus-saude-indigena-1
Heterotopia radical de povos cuja singularidade é respeitada nos cuidados.

https://redehumanizasus.net/87665-consulta-sobre-acessibilidade-no-transporte-aereo

RHS dando visibilidade para o Pacto de Acessibilidade, numa construção conjunta do acolhimento/inclusão das pessoas com deficiências no espaço aéreo

https://redehumanizasus.net/87702-construindo-a-15-conferencia-nacional-de-saude

construindo o espaço/tempo de maior participação social

https://redehumanizasus.net/87707-forum-pela-humanizacao-do-parto-e-nascimento-em-campinas-convida

outros olhares e práticas na chegada das crianças ao mundo

A errância como deslocamento não linear pode ser um contraespaço.

"Em delírios de febre, nos sonhos agitados, na meditação poética, na extrema concentração da batalha, ou no exercício dos dons artísticos, vivenciamos um descolamento das amarras do tempo. O estado alterado de consciência, as experiências de quase morte marcam no limiar de nossa cognição: A última fronteira do que pode ser pensado.
É assim que os trabalhadores da saúde vivenciam seu cotidiano de zelar pela vida: Numa proximidade quase tóxica com as contradições que nos definem e inquietam. Diferentemente das demais atividades humanas, a naturalização de nossas crenças exige um endurecimento do coração. Do mesmo modo que manter-se sensível e empático, exige que paguemos o preço da lucidez."

 

https://redehumanizasus.net/87605-psicologia-e-politicas-publicas-transmissao-on-line-pela-rhs-nos-dias-13-e-14-de-novembro

o lugar do psicólogo migra do espaço privado para o público. Contraespaço.

 

arte na RHS: haveria espaço mais heterotópico que este?

 

Livro de Foucault: “O Corpo Utópico, as heterotopias” , ed. n-1, 2013.