Um “fundamento” para a iniquidade

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O Sistema Único de Saúde deve tratar com igualdade os seres humanos em território brasileiro. Além disso, a atenção deve ser universal e equânime. A gestão deve ser permanentemente auditada pelas instâncias do controle social. Está na consituição.

As vidas não tem distinção de valor no âmbito do sistema de saúde. Porém na prática quem chegar aos centros de concentração de investimentos em saúde terá um percentual probabilístico de ser melhor atendido do que quem está distante dos centros de excelência. Os centros de excelência concentram os profissionais mais bem remunerados e a melhor infraestrutura. Logo, na prática quem atende e é atendido nos lugares onde o financiamento é deficitário tem uma vida que vale menos do ponto de vista da tabela de remuneração de serviços do SUS.

A universalidade, a igualdade e a equidade deveriam ser equilibradas nos lados da atenção e do trabalho em saúde. Este fato por mais óbvio que seja tem estado na sombra por demasiado tempo.

Uma hipótese para explicar esta distorção é a de que o silêncio impera porque os privilegiados com financiamento subsidiado acessam contratos vantajosos para o fornecimeto de insumos e equipamentos. Já do lado da prestação de seviços, rendas individuais acumuladas dentro do SUS podem ultrapassar os 300.000,00 reais ao ano. Sabemos onde estão estas rendas e sabemos o poder que estas posições destacadas e ambíguas detém dentro do sistema.

Podemos pensar que os de 347.214 profissionais médicos no Brasil (que tem uma renda inicial na faixa dos 100.000 reais por ano) são insuficientes para a saúde pública que necessitamos. Podemos achar que há uma distribuição irregular destes profissionais dentro do território nacional e que isto se deve as variações no mercado de salários e honorários. Podemos pensar que esta profissão merece uma renda ainda maior. Podemos certamente concluir que todas as categorias deveriam ser melhor remuneradas. Mas o caso é que a distorção salarial que existe no gráfico em forma de pirâmide ou lozango desta própria categoria é, em médio e longo prazo, insustenável. Assim como a grande pirâmide salarial dos trabalhadores da saúde em geral.

Uma expectativa otimista pode ser uma aposta com grande chance de êxito. Mas o sistema, na atual anarquia e disparidade no custeio e financiamento é injusto e insustentável a longo prazo. O gestor de uma entidade hospitalar filantrópica afirmou textualmente que acabar com as emergências superlotadas dos hospitais públicos é relativamente simples. Difícil é justificar os grandes repasses de verbas para estes hospitais se a porta de entrada deles não estiver permanentemente lotada.

Abaixo reproduzo um texto do presidente da Federação dos Trabalhadres da Saúde do Rio Grande do Sul. Vale a leitura pela articulação dos dados oficiais com a análise comparativa das distorções na forma e no montante das destinações das verbas do SUS.

PORTAL TRANSPARÊNCIA DO GOVERNO FEDERAL MOSTRA GASTOS EM SAÚDE

A previsão de arrecadação em 2011 do governo federal é de R$ 1.971.003.847.829,18 ou seja quase dois trilhões de reais. Destes até o momento, passados 135 dias do ano, arrecadou R$ 627.276.372.205,75 ou seja 31,82 %. Gastou-se até o momento em saúde o montante de R$ 4.904.596.211,80 BILHÕES.

Considere-se que deste total, já repassado, só o GHC (CRISTO, FEMINA E CONCEIÇÃO) levaram R$ 174.086.000 (MILHOES).

A VIGILANCIA SANITARIA: R$ 126.629.000 (MILHÕES).

A FUNDACAO NACIONAL DE SAÚDE: R$ 560.800.000 (MILHÕES).

A FUNDACAO OSWALDO CRUZ: R$ 508.912.000 (MILHÕES).

O FUNDO NACIONAL DE SAUDE: R$ 3.494.250.000 (BILHÕES).

Os DEMAIS: R$ 39.915.000 (MILHÕES).

Algumas conclusões baseadas nestes números números oficiais:

  1. 1. O governo federal aplicou em saúde nesses primeiros meses do ano 0,63 % do que arrecadou, menos de 1%. Portanto saúde não é prioridade.

2. Três hospitais do Rio Grande do Sul , Fêmina, Hospital Conceição e Cristo redentor,do grupo GHC, sozinhos levaram 3,54% de todo o recurso do Ministeio da Sáude. Isso é muito se levarmos em conta que só no Rio Grande do Sul temos mais de 300 hospitais. No Brasil passam de 5.000. Porém ainda é pouco recurso, como veremos abaixo, comparado com o Hospital de Clínicas de Porto Alegre que é menor.

3. O GHC tendo tres hospitais 100% SUS e com cerca de 7.5 mil funcionários deverá arrecadar em 2011 cerca de 468 milhões. Agora vejam, enquanto que o Hospital de Clínicas que não atende 100 % SUS, tem cerca de 3,5 mil funcionários deverá arrecadar 430 milhões do MEC, mais 130 milhões do Ministério da Saúde, totalizando 560 MILHÕES.

Para ilustrar melhor essa disparidade vamos comparar com SANTA CASA DE SÃO GABRIEL (hospital do interior do Rio Grande do Sul) que arrecadou em 2010 cerca de 14 milhões. Um total no qual 12 milhões foram recursos repassados pelo SUS. Isso dá uma receita de 1 milhão mensal para 350 funcionários. Então a Santa Casa de São Gabriel, sendo 4,6 vezes menor que o GHC, recebe 30 vezes menos recursos.

Com essa lógica de distribuição de recursos os 70% de todos os trabalhadores da saúde que atuam em Hospitais Filantópicos, vão continuar recebendo salários baixos, atrasados e trabalharão em condições que põe em risco a vida da população usuária. E, apesar de atender a maioria da população, estão sempre expostos a crises de custeio e financiamento. Isso torna a vida dos trabalhadores da saúde extremamente desigual.

Imagine, prezado leitor, se juízes fossem remunerados com semelhante disparidade. Alegariam que seria impossível arbitrar com justiça os conflitos. Como podem os trabalhadores da saúde proverem o adequado atendimento a população com um tal grau de desigualdade no financiamento? Acesso a saúde e ao judiciário são direitos pelos quais todos nós pagamos antecipadamente.

Milton Francisco Kempfer – Diretor Presidente da FEESSERS